quinta-feira, 11 de março de 2010

O que se diz dos Açores!...



Assis Brasil, um dos melhores escritores de Língua Portuguesa, é natural de Porto Alegre e descendente de açorianos.


Numa viagem virtual pelos atalhos da Internet, encontram-se informações sobre os Açores absolutamente fantasiosas. Para todos os gostos... ou desgostos. Há por exemplo um sítio francês, da responsabilidade de uma organização de ajuda aos países pobres da África, que nos põe no primeiro lugar da lista, elaborada por ordem alfabética. Mas, dito por uma nossa Direcção Regional da Cultura de há vinte e tal anos, pode ler-se que a música do hino dos Açores foi escrita por Teófilo Frazão! Outros sítios copiaram a informação, e o erro multiplicou-se, enevoando a verdade e a memória de Joaquim Lima, regente da banda Marcial Bom Jesus, de Rabo de Peixe, que o tocou pela primeira vez em 1894. Não haverá alguém que lhe devolva a autoria?

Há algum tempo, o meu amigo Manuel Estrada, médico no Cartaxo, descobriu um sítio do departamento de cultura de um simpático município brasileiro. Lá se dizia que o povoamento dos Açores foi feito à base de criminosos, mendigos e velhos. O pior é que mesmo entre nós não falta quem tenha a ideia de que os primeiros açorianos foram sobretudo foragidos. Não imagino como nasceu a lenda. Gaspar Frutuoso deixou a lista dos principais entre essa gente, que pertencia à melhor fidalguia do Reino. É verdade que alguns condenados foram mandados para cá, mas não se tratava sequer de grandes criminosos, porque esses eram castigados com a forca, membros decepados ou, mais tarde, desterro para S. Tomé, o mais terrível dos exílios. Entre os que vieram cumprir tal pena para Santa Maria, conta-se, por exemplo, uma menina de dez anos, condenada por ter matado, acidentalmente por certo, uma criança.

E será que vieram velhos, como constava no tal sítio? Trata-se com certeza de confusão com o nome da ilustre família dos Velhos, pois que vários foram os familiares de Gonçalo Velho Cabral, comendador de Almourol, que se lhe juntaram em Santa Maria, mas todos homens na força da vida ou muito jovens mesmo. Pobres também vieram, naturalmente, para todos os trabalhos que os fidalgos não faziam. Mas não mendigo, com certeza. E, se eram mendigos no Reino, cá deixaram de o ser.

No mesmo sítio dizia-se que para a colonização do Brasil, a meados do século XVIII, foram enviados muitos velhos e doentes. Pura invenção. Perderam-se todas as relações de emigrantes, mas, a serem cumpridas as exigências da Coroa, os homens não teriam mais de quarenta anos e as mulheres trinta.

O problema parece estar na existência de duas correntes no Sul do Brasil. Uma que vai mantendo e reavivando as suas raízes açorianas, de que se orgulha, outra que vê nesses mais de seis mil emigrantes a razão de algum atraso do Brasil meridional. Em contraponto, a colonização italiana, e sobretudo a alemã, seria a de todas as virtudes. Ora os açorianos foram pioneiros absolutos. A sua função principal foi assegurar a presença portuguesa nas fronteiras com as colónias espanholas, garantindo o cumprimento do tratado de Madrid. Para isso, tiveram de suportar dificuldades sem conta. Se o clima não lhes era adverso, já os terrenos agrícolas eram totalmente distintos dos nossos. Tratava-se de solos sedimentares, menos férteis do que os vulcânicos das ilhas, que não permitiam a maior parte das culturas a que estavam habituados, a começar pelo trigo, o que os obrigou a aprenderem a usar a farinha de mandioca.

Foram eles que desbravaram. Quem veio a seguir já encontrou um ambiente propício à prosperidade cujo mérito há quem queira atribuir-lhe em exclusivo. Como nota final, diga-se que a Drª. Lélia Nunes, informada por mim a respeito dos erros do sítio referido, escreveu de imediato ao prefeito. E este também de imediato respondeu. As informações sobre o povoamento dos Açores e a colonização do Sul do Brasil por açorianos foram apagadas, enquanto que a Drª. Lélia Nunes foi convidada para colaborar na reposição da verdade.

25 comentários:

Mar de Bem disse...

Há aqui uma coisa que me incomoda, quando se fala do povoamento dos Açores. Porque querem que tenha sido quase só escória?
É preciso não esquecer os inúmeros fidalgos, que não sendo primogénitos, tinham que se fazer à vida, já que nada lhes calhava em herança. Todos os capitães donatários eram fidalgos que mereceram essas mordomias porque ajudaram os nossos reis de então. Houve também fidalgos flamengos, espanhois, etc

Sou descendente dum fidalgo espanhol que ajudou... (o Prior do Crato (?). Poderia ir à procura nas "Saudades da Terra" do Gaspar Frutuoso. Tenho ali vários volumes. Sei que é no 6º volume, mas agora não me apetece procurar). Não sei na realidade quem André de Roriz ajudou. Pagaram-lhe com a capitania da Lajes do Pico e mudou o seu nome para Madruga - Gaspar Frutuoso dixit.
Aquela gente muito trabalhou para construir a sua vida e...ainda tinham que pagar tributo ao Rei. Na ilha do Pico, com tantas erupções, não havia o que comer, quanto mais para pagar tributo. E foi assim que resolveram pagar ao Rei doutra forma, sem ser em vinho e cereais. Como havia muita madeira, construíram um galeão na costa sul do Pico...e lá está a Prainha do Galeão!!! Foi assim que pagaram ao Rei!!!

Os açorianos foram sempre estóicos e aventureiros, por isso desandaram mar abaixo à procura doutro El Dorado - o Brasil.
(um meu trisavô foi emigrante no Brasil)
Quando começaram a desbravar caminhos para Oeste, na América do Norte, trocaram os caminhos do mar...e o mar tem muitos caminhos!!!
(No fim do sec XIX o meu avô andava a serrar árvores gigantes para a contrução, não sei em que Estado dos EUA, a caminho da Califórnia)

Qualquer um deles voltou rico, tanto o do Brasil, como o da América! AÇORIANOS de primeira água!!!

Tenho muito orgulho nos meus ancestrais...e já nem sei porque me deu para dizer isto tudo. Perdoai-me se saí do contexto, mas deu-me muito prazer falar-vos assim.

jv disse...

Daniel, muito esclarecedor o teu texto.
Eu confesso que os meus conhecimentos de História Dos Açores são básicos, apesar de sentir algum interesse e curiosidade óbvias, vou sempre adiando, pela disponibilidade e pelas opções de prioridades de leituras do momento.
Gaspar Frutuoso foi e é uma prioridade importante para mim, pela enorme qualidade da sua obra e ser a maior fonte referencial do povoamento das nossas ilhas e quando surgir a oportunidade é por aí que começarei. Recentemente saíu uma obra sobre a História dos Açores de vários autores que penso adquirir, porque penso ser o que de mais completo sobre nós se escreveu.
É com alguma mágoa que constato que a nível escolar, apesar de há muito tempo disto ouvir falar, não surgir nos seus programas de ensino, nada que nos possa elucidar minimanente com alguma objectividade e rigor, a nossa história de açorianos, evitando que se continuem a divulgar erros grosseiros, como aqueles que mencionaste e penso que aí podias dar um grande contributo, pela tua paixão pela História, pela tua qualidade de escrita, e principalmente pelo óptimo pedagogo que és, na elaboração de um manual, que de certeza iria contribuir muito positivamente, para o conhecimento global daquilo que hoje somos.
Queiram aproveitar.
Um abraço.
José Fernando

Carlos Faria disse...

Apenas para dizer que gostei muito deste texto, que me deu informação sobre preconceitos e erros que se instalam na história deste povo: com virtudes e defeitos, gente boa e outra nem por isso; mas isso é a humanidade na sua realidade.
Somos apenas humanos com todos esses genes misturados que até nem são muito diversificados face ao número de exemplares da espécie no planeta.

samuel disse...

O desconhecimento é grande e, como se sabe, muitas vezes é atrevido...
Cá por casa, quando ouvimos (infelizmente, ainda muitas vezes) falar da "ilha dos Açores"... eu ainda consigo sorrir, mas a açoriana... esse já não tem paciência. :-)))

Abraço.

samuel disse...

"Essa" já não tem paciência.
A minha açoriana é feminina!
É assim que começam os rumores... :-)))

Abraço.

Mar de Bem disse...

Oh, Samuel, diz à Maria do Amparo que a Margarida Madruga (dos 3 irmãos arquitectos, do Pico/Faial) lhe manda mil beijinhos.
Não a vejo há quase...quarenta anos!!!
...e "abreijos" p'ra ti!!!

vovó disse...

Margaria!!!!!! :)
que bom encontar-te por aqui!!! :)
temos que marcar encontro:)...

aqui retribuo os teus 1000 beijinhos... por 1000 beijocasssss
vovó Maria (Maria o Amparo)

Mar de Bem disse...

Queridíssima, já és avó? Pois é, temos idade p'ra isso...Olha, então vão beijos rendados com a espuma do nosso mar.

Vivo 6/7 meses por ano no Faial e venho passar o inverno a Lisboa. O inverno nas nossas ilhas é tenebroso. Parto p´ra lá no fim deste mês. É a vida de reformado, uma vida de rico (o dinheiro não entra aqui). Não sou avó ( minha filha ainda não me deu essa prisão encantada), mas estou me consolando!!!
Beijos, beijos...ah, como éramos novas e bonitas!!!

vovó disse...

Querida Margarida! :) como gostei de saber de ti!!
pois é, sou avó de uma lusoamericana, com 5 anos (nascida na Terceira) e de duas anglolusonipónicas, uma com 2 anos e... e a outra 15 meses! :) todas, são os regalos da vovó! :)
aos Açores, ainda só vou de férias... às vezes...

Daniel! desculpe este abuso, invadindo o seu blog, para dar recados!...

beijocasssss
vovó Maria

Ibel disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ibel disse...

Gostei de ver por aqui a Maria do Amparo. Claro que ela não me conhece, mas lembro-me de a ver na televisão e também cá por Braga, com o Samuel, numa noite de canto.

Daniel,
É por tudo isto que vale sempre a pena visitar o Espólio.
Tive uma colega em Coimbra, açoriana, cujo apelido era Velho.Nunca mais a vi e já não me lembro de que ilha era, mas penso que seria de S. Miguel. Chamava-se Luzia.Se a conhecerem, falem-lhe da Isabel Antunes.

Beijos para todos.

Daniel disse...

Margarida e Maria do Amparo
Foi uma delícia assistir ao vosso diálogo e um privilégio ter sido nesta nossa sala comum que se proporcionou o vosso reencontro. Quanto ao "éramos bonitas" (Samuel, por via dos "rumores" repara que pus aspas, transcrevi o que disse a Margarida), eu poria isso no prsente. Sem favor.
Samuel, Geocrusoe e José Fernando
Raramente se vê algo sobre os Açores que não contenha erros óbvios e outros menos óbvios.
Quanto ao livro de História dos Açores de que falas, sinceramente não será aquilo de que estarás à espera. Está na linha dessa corrente da História em que se debatem mais ideias do que se contam factos. Olha que cheguei a pnesar na hipótese de escrever umas coisas simples, para jovens, mas o Teixeira Dias disse-me há uns meses que vai organizar um.
Abraços.
Daniel

jv disse...

Daniel, vou estar atento e se vier do Teixeira Dias, vem de certeza com qualidade.
abraço.
José Fernando.

Francisca e Mafalda disse...

Daniel,

Texto esclarecedor.

Gostamos principalmente de saborear a defesa que faz desse "torrão " lindíssimo plantado em pleno oceano.

Beijinho

Francisca e Mafalda

vovó disse...

Daniel!

Obrigada pelo carinho e pela hospitalidade! :)

beijocassss
vovó Maria

Daniel disse...

Francisca e Mafalda
Que bom que tenham gostado! Mas não defendo o meu torrão, e sim a verdade, que é o que mais interessa.
Vovó Maria
Em hospitalidade, ninguém ganha a vocês, terceirenses.
JV
Tambémm penso que do Teixeira Dias só pode vir qualidade.
Abraços.
Daniel

Ibel disse...

Daniel!!!!!

Os outros comentadores não merecem abraços? Tau, tau...

Daniel disse...

Ih, Jesus, de quem eu fui esquecer-me! Tão imperdoável quanto um abraço em ti é imperdível.
Aqui fica, grande como a Sé de Braga.
ABRAÇO!!!
Daniel

Mar de Bem disse...

Oh, Daniel, pró que havia de me dar:

http://margaridamadruga.blogspot.com/

fui obrigada!!! e não é que estou gostando?

Daniel disse...

Margarida
Está coisa digna de se ver. O pior é que, se eu fosse um nabo, era daqueles do tamanho da cabeça de um homem, como diz Frutuoso de uns que se criaramm na Fajã. (Vazios, acrescenta ele...)
Digo isto porque tentei deixar lá uma mensagem e não conegui. Hei-de pedir ao Rodrigo para me ensinar.
Disse mais ou menos isto:
"Não madrugaste, mas chegaste a tempo. Está coisa linda de se ver. Pudera!
Um abraço, pintora de telas e sentimentos.
Daniel"
Gostaria de ter comentado aquela espantosa história da menina que não era Fátima.
Muito bem.

Mar de Bem disse...

Oh,Daniel, ainda hoje sinto um arrepio ao lembrar-me de como Deus me iluminou, para saber comunicar com um semelhante... dissemelhante! Foi obra de Deus, linda!!!
...e calhou-me vivê-la. Maravilha!!!

Daniel disse...

Imagino, Mar de Bem!
Aconselho uma visita à caixa de comentários de "Outra vez o plágio!" Há lá desenvolvimentos que penso serem interessantes.

Mar de Bem disse...

A LIA faz anos hoje!!!

Anónimo disse...

Olá Daniel,

Lembrar: hoje é o Aniversário da Dra. Isabel Fidalgo.

Um grande abraço.

Mafalda e Francisca

Daniel disse...

Minhas boas amigas, estive sem acesso à Internet por avaria de uma coisa que dizem chamar-se ATI.
Mas, embora atrasado, já lhe deixei o meu abraço de parabéns no meio dos seus Frutos.
Abraços.
Daniel