A primeira vez que li Saramago foi no Levantado do Chão. Desde Quando os Lobos Uivam que não tinha havido outro romance português que me fascinasse tanto. Depois, veio o Memorial do Convento, e aí encontrei algumas das mais belas páginas de sempre da literatura portuguesa. Foram-se seguindo outros livros, mas nenhum voltou a entusiasmar-me tanto como aqueles.
Só arranjei tempo para O Evangelho Segundo Jesus Cristo muito depois da polémica gerada à sua volta. Não me impressionou em termos religiosos, sendo quase nulo como investigação histórica. E levei todo o livro até encontrar uma frase literariamente genial: “Homens, perdoai-lhe, porque ele não sabe o que fez.” Pouco, para um autor de quem tinha passado a esperar sempre do melhor que pudesse ser escrito em Português ou em qualquer outra língua, e cujo estilo já me parecera um tanto ou quanto cansado em O Ano da Morte de Ricardo Reis. Há anos que não o leio. Não duvido de que tenha perdido alguma boa obra, mas o tempo não dá para tudo e o mundo está cheio de boa literatura.
A propósito de Caim, Pilar, sua mulher, disse que o leitor, no final, sentir-se-á como se tivesse sido apunhalado no estômago. Ora não me apetece ser apunhalado. Nem mesmo literariamente. Para histórias negras, que nos amarfanham a alma, basta a realidade. Não é necessário reinventá-la em coisas como o Ensaio Sobre a Cegueira, por exemplo. Do qual poderia dizer-se, também, que é um manual de maus costumes. Nunca recuei na leitura de livros tétricos, pungentes, mas reais. Ainda que me tenha ficado para toda a vida o sabor amaríssimo do Diário, de Anne Frank, ou da Esperança, de Malraux.
Quanto às declarações de Saramago a respeito da Bíblia, ele pode dizer o que quiser. Mas tem de aceitar que quem julga que ele está errado o diga frontalmente. A liberdade de expressão não é só para dizer, é também para contradizer.
A Bíblia não é um livro, é um conjunto deles. É a literatura e a história de um povo. E também a história da sua fé. Escritos sem preconceitos nem vontade de agradar a ninguém. Há, nos autores bíblicos, uma liberdade de expressão que qualquer amante da liberdade deveria admirar. Porque eles se revoltam contra o poder real abusivo ou contra os ricos à volta dos quais nada medra. Chegam a revoltar-se, até, contra o próprio Deus. E apenas contam a verdade ou aquilo que entendiam como tal. Cheios de imprecisões históricas, geográficas e teológicas. Nenhum deles é um livro de ciência, embora a visão do Mundo segundo a ciência daquele tempo também lá caiba. Quando se acreditava, por exemplo, que havia um oceano superior, inesgotável, de onde vinha toda a água da chuva, e por isso capaz de provocar uma inundação que chegasse a cobrir as mais altas montanhas. Ou que o Sol andava à volta da Terra, ideia que permaneceu durante mais dois milénios. Contra o próprio Galileu poderia ter sido usado um dos seus livros, o Tratado da Esfera, em que ele ainda seguia Ptolomeu.
Na Bíblia, que não é um tratado de Teologia, a imagem de Deus reflecte a necessidade de um povo. Por isso umas vezes Ele é visto como a infinita misericórdia, e outras como um vingador absoluto. Porque os filhos de Israel precisavam de sentir a esperança para o perdão dos seus pecados ou a crença num libertador. E, para os costumes de então, tal como para a realidade de hoje, só um exército mais forte podia vencer a força de um opressor. Ao longo dos séculos em que a Bíblia foi escrita, os Hebreus nunca fizeram uma guerra de conquista. Foram apenas vítimas das maiores sevícias, cativeiros e destruições que nesses tempos aconteceram.
25 comentários:
Escolheste tão bem a imagem com que ilustras um texto esclarecedor sobre a campanha publicitária tão bem criada à volta de Caim.
Beijo, querido Amigo
Certo! Não sei se alguma vez fui crente, já que agora não sou, mas vi até onde vai fundo e cria raizes a fé.
Exactamente por isso, nem me teria aproximado desta bulha, não fosse o caso de, aos exagerados bordões ateus de Saramago, um tonto ter respondido, não com iguais bordões cristãos, mais ou menos exagerados, mas antes acrescentando julgamento, condenação e pena. "Renuncie à nacionalidade e desapareça!" Aqui há uns tempos... desapareceria em fumo, no Rossio ou na Praça do Giraldo. E isso é que não é admissível! O resto, tudo é... e nós bem sabemos como os publicitários são uns exagerados. :-)))
Grande abraço.
Conheço razoavelmente a obra de Saramago, reconheço que a sua escrita está a ficar repetitiva, mas continuo a admirar a crítica social que os seus livros possuem. Esta luta parece-me apenas uma técnica publicitária possível porque felizmente vivemos em liberdade.
Mas a descrição deste post sobre o que é a bíblia está excelente e julgo que Daniel de Sá faria melhor defesa do que é o Livro do que o teólogo escolhido para o debate na SIC.
Ao fim de dois mil anos os ateus começam a ter voz, já não é sem tempo.
Com amizade.
Olá Daniel,
Vim aqui,de fugida,para te dar os parabéns ao saber que a tua amiga foi escolhida para a Cultura,no elenco dos novos ministros.Fiquei contente.Agora,não serão somente as ilhas,mas Portugal, no seu todo, a conhecer e a atingir «outras margens»...
Quanto ao post «Saramago,a Bíblia e a minha opinião»falarei mais tarde porque agora,o dever chama-me.Avanço desde já que este assunto é complexo e muito.
Abraço a todos
Ana, a escolha foi do Rodrigo, mas os nosos gostos artísticos, musicais (de Beethoven a Zeca Afonso) e clubísticos coincidem.
Samuel, a Inquisição matou uma média de sete pessoas por ano em Portugal, com o alto patrocínio do Estado. Sete mortos a mais por ano, se nesse tempo se soubesse ler a Bíblia.
Geocrusoe, tenho estudado a Bíblia a sério, o que implica conhecer a história, a geografia e os mitos do Médio Oriente.
Cid, desde muito novo que convivo livremente com ateus livres. Ainda o Salazar mandava e eu já lia, por exemplo, Jacob Bensabat ou Bertrand Russell. No seminário comboniano de Mocada (Valência), frequentei um curso livre sobre Jacques Monod. O curso mais concorrido (50 alunos), que esgotou as inscrições e teve de recusar muitas, foi sobre Marx. E estudei o islamismo e todas as principais religiões do Mundo. Estudo não crítico, entenda-se, apenas numa perspectiva histórica. Ah, e as vidas mais negras dos papas mais execráveis, e a Inquisição (semm desculpas), etc.
Eduarda
Pois é, minha amiga. Por isso apaixona tanto.
Abraços.
Daniel
Daniel, penso que fazes uma análise muito objectiva do que é a Bíblia e que na realidade são vários os livros que a compõem e já o foi muito polémico a maneira como foram seleccionados aqueles que a constituírem. Para mim o problema que se coloca em relação à Bíblia é o seu carácter de Sagrado, da sua inspiração divina e até mesmo o ser considerada a própria Palavra de Deus no seu dogmatismo mais ou menos literal da sua aceitação por alguns sectores religiosos.
Todas as suas incoerências(como aquelas que mencionaste) já foram largamente debatidas, ao longo dos tempos com muito rigor,por uma larga franja de intelectuais,religiosos etc...levando que a sua interpretação tenha evoluído nas mais variadas direcções,conforme as posições defendidas.
Em Saramago,considero que que faz a sua interpretação menos como ateu e mais como neo-realista que é, de denúncia. O rigor da sua interpretação até nem é muito brilhante, dada a sua visão demasiado literal para os tempos de hoje.O objectivo a que se propôs está a sê-lo totalmente conseguido ajudado por toda esta polémica, que se vai traduzir num rentável negócio que neste momento é realmente desproporcional à sua qualidade de escrita que nos seus momentos mais altos injustamente não o conseguiu.Os comentários desastrosos e incompreensíveis de políticos, e de outras gentes, que ao o colocaram na fogueira duma inquisição primária,contribuem para o seu sucesso.Claro que Saramago agradece.
Questionar Deus em literatura, dada a nossa super limitação de humanos, é um tema que foi e sempre será apelativo e apanágio em muitos escritores(tu já o fizeste e bem) quer sejam ateus, agnósticos ou crentes, a diferença residirá sempre na maneira séria,coerente, respeitosa e mais ou menos sublime com que se vier a tratar deste assunto, que resultará sempre independentemente das nossas crenças, ou não, num acto de verdadeira religiosidade.
Um abraço, José Fernando.
Assisti à ultima parte ca conversa entre Saramago e Carreira das Neves...foi assim uma coisa de "nem aquenta nem arrefenta" muito aquém das minhas expectativas depois do diz que disse de ambas as partes nestes últimos dias. Enfim, tanta tinta que correu e a montanha acabou por parir um murganho raquítico. Gostaria de ter ouvido um Carreira das Neves menos titubeante. Nós Católicos somos fracos na defesa dos nossos valores e temos medo de reconhecer os nossos erros. É verdade que durante MUITOS anos a leitura da Bíblia não foi prática corrente e é preciso reconhecer isso e dizer porquê; deixou de se rezar a oração oficial da Igreja e passou a cantar-se o Terço (reconhecendo que nele estão enunciados passos importantes da vida de Cristo) mas muito aquém das Laudes, Vésperas, Completas... A Igreja precisa de esclarecer os fieis pois só uma Fé esclarecida é duradoira, sem esclarecimento vem um Jeová, argumenta e lá vai o “católico” engrossar as fileiras das “curas” e os bolsos dos “Bispos”
Abraços
Daniel,
Adoramos a pertinência e a sensatez reveladas no tratamento deste assunto.
Se de facto o objectivo das declarações de Saramago era a provocação e a polémica, com o intuito de gerar "apetência" e curiosidade para a leitura de "Caim", logo veremos se esta operação de markting funcionou...
Uma coisa é certa, a notícia espalhou-se e está por toda a imprensa internacional e também não será por acaso que a discutimos aqui e agora.
Independentemente de concordarmos ou não com as declarações proferidas, há, no entanto, algo positivo na situação criada - o facto de nos ter levado a reflectir e a trocar opiniões sobre um dos pilares fundamentais da civilização ocidental.
Beijinho
Mafalda e Francisca
Amigo,
Hoje estou muito cansada, por isso felicito-te, tal como a Eduarda pela escolha da tua amiga para ministra da cultura.Quanto ao Saramago,voltarei cá com mais tempo.
Felizmente vivemos em democracia e ele pode exprimir aquilo que pensa.E considero abusivo dizerem que ele fez aquelas declarações para vender o produto.O Saramago vende, mal publica um livro, não precisa de publicidade.
há quem o chame escritor maldito.Talvez.Mas um homem que inventou uma Blimunda e um Baltazar tem que ter uma alma grande.Aquel par ficcional é poesia pura.
Abraço
JV
Sim, meu Caro, desde o meu primeiro livro que questionei a relação do Homem com Deus. E tu até fizeste uma comparação que me agradou muito.
Ana
Faltou electricidade nesta zona da ilha. Mas confesso que sempre achei o Carreira das Neves fraquinho. Em Teologia tive como professores alguns dos melhores teólogos de Espanha, pelo que se tornou difícil, depois disso, que qualquer um me agrade.
Mafalda e Francisca
Estou convencido de que o Saramago é mesmo ignorante em quetões bíblicas. Para se a perceber é preciso conhecer bem a história, a geografia, os costumes, etc. daquele tempo e do Médio Oriente.
Lia
São duas figuras de grande poesia, sim, mas creio que o Saramago se alongou demasiado. Aliás ele poderia ser mais breve, sem perder qualidade, antes a aumentando.
Abraços
Daniel
Daniel
Gostei do que disseste . Que te fascinou a leitura do " Levantado no Chão", a quem alguém já chamou, com imaginação, a Biblia do Alentejo. Também me marcou e inquietou quando o li, coisa que já fiz uma segunda vez.
O resto da polémica, Hebreus incluidos, parece-me um autêntico jogo de sombras,numa luta para quem quer ficar fora ou fugir de dentro da caverna, procurando o melhor lugar para ser observador privilegiado de um passado ainda obscuro.
Concordo com a Ana. O debate na TV foi coisa de tristes. Como se estivessem ambos , politicamente, a querer perder poucos pontos nas sondagens.
Já reparei também que alguns teólogos, em confronto directo com o homem da Azinhaga do Ribatejo, se apagam um pouco. É que insistir no binómio da interpretação literal/ metafórica da Biblia é no que dá.
Um abraço
Manel
Daniel, conheces, por acaso, André Torres Queiruga?
Portugês gosto muito de Tolentino Mendonça
Ora falha de luz mais chata...
Tenho muita pena de não ir a S Miguel este fim de semana homenagear o Eduíno e estar com a Lélia, estar com o Onésimo e estar contigo que certamente irás estar com eles todos.
Abraço
Eu acho muita graça a esta feira das vaidades:
Saramago julga-se um génio. É bom, mas não chega a tanto. Gosto da sua escrita, que não é fácil, mas tem que se lhe diga;
Os outros, que acham que têm o monopólio do conhecimento, insurgiram-se contra...VENTO!!!
P'ra quê tanta controvérsia? O homem tem o direito de perorar sobre o que quer que seja. Contrariá-lo é dar-lhe corda. Eu não concordo com muita coisa que ele, Saramago, vaidoso, diz, talvez julgando que é o único a descobrir outras vistas sobre assuntos teológicos ou religiosos - o húmus da vida!
Nem Saramago tem uma visão plena, nem os defensores das coisas do SAGRADO. Não há humildade em lado algum para perceber que há mais coisas entre o céu e a terra que alguma vez o Homem possa entender.
É que ninguém sai da sua. Moderação, minha gente. Humildade, porque o nosso conhecimento é uma ínfima parte do GRANDE CONHECIMENTO...
Daniel, isto que escrevi atrás, não te inclui, porque és um homem parcimonioso e não andas a bradar aos céus!
Quando um escritor nos «toca»,dificilmente aceitamos que a sua escrita seja posta em causa,muito menos em praça pública.
O facto de Saramago ter esta imagem cruel de Deus ,de O ver como é descrito em «Caím»(e não só),com exageros,como ele próprio já reconheceu,não o deve impedir de ter a liberdade de mostrar ao leitor aquilo que pensa.
J S nunca aceitou o Deus que a Igreja,ao longo dos séculos,tentou fazer passar.Não admite a existência desse Deus.E isso é um problema dele com Deus.
Saramago,para mim,abana,abala e acorda consciências.E porque é que digo isto?Porque é um escritor que tem a coragem de dizer,de denunciar, de desmascarar.E isso tem um preço.
As relações humanas,a exploração do homem pelo homem,a relação do homem com Deus são questões de fundo para este HOMEM DE FÉ!
Agora,por favor,termos como «publicidade»,«marketing»,
«ignorância»,«vaidade»,convenhamos...não incorporam nem vestem este vulto incontornável da Literatura Portuguesa.
Disse Saramago há quase onze anos em Estocolmo,aquando do seu Nobel,num discurso «forte e emotivo»:
« (...) Cumpriram-se hoje exactamente 50 anos sobre a assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos.Neste meio século não parece que os Governos tenham feito pelos direitos humanos tudo aquilo a que moralmente estavam obrigados.As injustiças multiplicam-se,as desigualdades agravam-se,a ignorância cresce,a miséria alastra.A mesma esquizofrénica humanidade capaz de enviar instrumentos a um planeta para estudar a composição das suas rochas,assiste indiferente à morte de milhões de pessoas pela fome.Chega-se mais facilmente a Marte do que ao nosso próprio semelhante.
Alguém não anda a cumprir o seu dever.Não andam a cumpri-lo os Governos,porque não sabem,porque não podem,ou porque não querem.Ou porque não lho permitem aqueles que efectivamente governam o mundo,as empresas multinacionais e pluricontinentais cujo poder,absolutamente não democrático,reduziu a quase nada o que ainda restava do ideal da democracia.Mas também não estão a cumprir o seu dever os cidadãos que somos.(...)Tomemos então,nós,cidadãos comuns,a palavra.Com a mesma veemência com que reivindicamos direitos,reivindiquemos também o dever dos nossos deveres.
Talvez o mundo possa tornar-se um pouco melhor.»
Jesus Cristo diria isto melhor?Mais palavras para quê?
Como sugestão de leitura de fim-de-semana convido-vos a (re)passar os olhos pelo poema de Natália Correia «Queixa das almas jovens censuradas»,tão bem cantado pelo José Mário Branco, e vejam aí as raízes da coincidência...
Manel
Penso que se justifica eu fazer um artigo a explicar a origem da história de Caim e Abel. Dos teólogos que ouvi ainda não houve nenhum que abordasse a questão. Posso adiantar que há vários "western" que pegam no tema adaptado aos tempos dos pioneiros.
Ana
Não conheço o Queiruga. O Tolentino esteve fraquinho na conversa com o Saramago que o "Expresso" publicou. Foi apenas simpático.
Margarida
Todos nos julgamos um pouco detentores da verdade. Se assim não fosse, não defenderíamos as nossas opiniões com tanta convicção.
Eduarda
Tens razão no que dizes. Deixei de ler o Saramago, tal como fizera com o Vergílio Ferreira e já fiz com o Lobo Antunes, por respeito à boa imagem que tinha deles porque, a partir de certa altura, passaram a não me agradar.
Abraços.
Daniel
Ainda não li a entrevista do Tolentino, tenho-a aqui aberta para ler "quando tiver tempo". Essa impressão de simpatia foi o que me ficou do "frente a frente" Carreira das Neves/Saramago.
Fico à espera do artigo
Beijinho
Daniel
Já para não falar, como sabemos, do " a Leste do Paraiso" do Steinbeck/ Kazan, com o eterno conflito entre o bem e o mal a ser aqui, e quanto a mim, muito bem dissecado .
Cá fico também á espera do artigo, decerto com mais achas para a fogueira, mas com a plena certeza da consistência do teu saber nessa área. Até estou em crer que o Saramago o irá ler também. Alguém que te cita na primeira página de um dos seus Cadernos de Lanzarote, é bem capaz de ser um teu leitor. Só ganharia com isso.
E por falares em Westerns. Será que se a média de indios mortos por lá rondassem os sete por ano( coisa insignificante) a história das " américas" teria sido outra?
Abraços
Manel
Fiquei com duas curiosidades, o que reconheço é coisa pouca neste contexto: 1- saber da citação de Saramago acerca do nosso ilustre conterrâneo,o que significa ler, ler sempre Saramago. O velho e o mais recente.
2- escutar e apreender o que virá de Caim e Abel. Pela mão de Daniel.
Espero o tempo medido.
Sabes, Daniel, às vezes vir aqui é procurar respostas às nossas fragilidades.
O teu comentário ao meu comentário foi luz no meu espírito.
Sem dúvida que a minha infância tem aqui um papel preponderante. Em pequenina queria pensar pela minha própria cabeça e não me deixavam. E ainda por cima me batiam. Aos 12 anos descobri que era mais fácil fazer como eles (os meus Pais) queriam. Dava-me menos trabalho e...palmadas. Domaram-me!...
...e é talvez por isso que não tenho arcaboiço para defender a essência do meu ponto de vista e me perco em derivativos inócuos, não vá uma mão aparecer para me bater...
(Sabes, se alguém vier fazer-me uma festa na cara, retraio-me logo?)
E a infância vai tão longe... mas a estuporada ainda me chaga!!!
E haja saúde!!!
Daniel. Já escaldado com as minhas intervenções, peço com todo o respeito, que me esclareças o que é um "ateu livre" e um "católico livre".
CS
Começo por ti, por ser resposta que interessa à clareza das ideias à qual, pelos vistos, não fui fiel. Eu queria dizer que se tratava de ateus que se expressavam livremente (o pensamento é sempre livre) e católicos que o eram por convicção e não por conveniências sociais.
Mar-ia
Aquilo dito assim pelo Manel até parece coisa importante. O saramgo limitou-se a referir os nomes dos participantes numas jornadas literárias em Ponta Delgada. Eu até sou o último da lista... Mas ele tratou-me com tanta simpatia, ao ponto de nunca mais me ter largado (nem eu queira) durante o resto do dia e o jantar. Até foi passear comigo pela praia do Pópulo, já noite fechada, querendo que fôssemos fotografados juntos aí. Fiquei com uma óptima impressão dele.
Para os outros amigos (e estes, claro):
O artigo sairá talvez ainda hoje. Está feito, espera só a disponibilidade do Rodrigo.
Abraços.
Se um qualquer escritor, bom ou mau, se atrevesse a dizer metade do que este cavalheiro disse, cairia o "carmo e a Trindade" por se tratar, claramente, de jogada comercial, de oportunismo livreiro, de marketing planeado.
Mas este cavalheiro, que ainda estou para perceber como ganhou um Nobel....é irrascível, vaidoso, embirrante, fanático e intolerante.
E será bom nunca esquecer a sua acção á frente do "Diário de Notícias", em 1975. Lembram-se?
Ataca o "capital"...mas quando é preciso dar um empurrão a novo livro, emprega as técnicas dúbias que tanto critica.
Já perceberam que eu não gosto do cavalheiro.
Nem um bocadinho!
Deixo aqui um artigo que saiu no Público. Palavra de honra que eu não entendo como se podem fazer afirmações destas.
Não li o livro de Saramago e não vou comprá-lo, porque sei que me cairá no sapatinho.Também não sou daquelas pessoas que fica com curiosidade histérica, sempre que há escândalos sobre o que quer que seja.e também não me escandalizo com facilidade.Se gosto de Saramago? Se o acho um homem amargo? Sim.Há nele a amargura de quem conhece bem o ser humano.O ensaio sobre a Cegueira é a melhor das alegorias sobre o pantanal onde vivemos.Outros chamam-lhe Vale de Lágrimas.Vem tudo a dar no mesmo.A Eduarda fez um comentário extraordinário, logo não me alongo mais.Mas hoje li algo que me inquietou.É provável que já tenham lido ou não queiram ler. Não importa. Fica aqui, porque, mesmo não se gostando de Saramago, há também limites para a maldade e para o ódio, sobretudo para quem o considera escritor maldito.
"Publico 23.10.2009 http://jornal.publico.clix.pt/noticia/23-10-2009/uma-farsa-18072781.htm
Uma farsa
Por Vasco Pulido Valente
O problema com o furor que provocaram os comentários de Saramago sobre a Bíblia (mais precisamente sobre o Antigo Testamento) é que não devia ter existido furor algum. Saramago não disse mais do que se dizia nas folhas anticlericais do século XIX ou nas tabernas republicanas no tempo de Afonso Costa. São ideias de trolha ou de tipógrafo semianalfabeto, zangado com os padres por razões de política e de inveja. Já não vêm a propósito. Claro que Saramago tem 80 e tal anos, coisa que não costuma acompanhar uma cabeça clara, e que, ainda por cima, não estudou o que devia estudar, muito provavelmente contra a vontade dele. Mas, se há desculpa para Saramago, não há desculpa para o país, que se resolveu escandalizar inutilmente com meia dúzia de patetices.
Claro que Saramago ganhou o Prémio Nobel, como vários "camaradas" que não valiam nada, e vendeu milhões de livros, como muita gente acéfala e feliz que não sabia, ou sabe, distinguir a mão esquerda da mão direita. E claro que a saloiice portuguesa delirou com a façanha. Só que daí não se segue que seja obrigatório levar a criatura a sério. Não assiste a Saramago a mais remota autoridade para dar a sua opinião sobre a Bíblia ou sobre qualquer outro assunto, excepto sobre os produtos que ele fabrica, à maneira latino-americana, de acordo com a tradição epigonal indígena. Depois do que fez no PREC, Saramago está mesmo entre as pessoas que nenhum indivíduo inteligente em princípio ouve.
O regime de liberdade, aliás relativa, em que vivemos permite ao primeiro transeunte evacuar o espírito de toda a espécie de tralha. É um privilégio que devemos intransigentemente defender. O Estado autoriza Saramago a contribuir para o dislate nacional, mas não encomendou a ninguém principalmente a dignatários da Igreja como o bispo do Porto - a tarefa de honrar o dislate com a sua preocupação e a sua crítica. Nem por caridade cristã. D. Manuel Clemente conhece com certeza a dificuldade de explicar a mediocridade a um medíocre e a impossibilidade prática de suprir, sobre o tarde, certos dotes de nascença e de educação. O que, finalmente, espanta neste ridículo episódio não é Saramago, de quem - suponho - não se esperava melhor. É a extraordinária importância que lhe deram criaturas com bom senso e a escolaridade obrigatória.
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