sábado, 16 de maio de 2009

A Festa do Senhor Santo Cristo

A Fé e a Esperança. A Fé em Deus no culto do Senhor Santo Cristo no Santuário de Nossa Senhora da Esperança. Os olhos humanos precisam de reflexos divinos para se aproximarem do Infinito. Que podem ser as cores do ocaso ou as pétalas de uma flor. Ou uma bela imagem feita por mãos desconhecidas. Esta, por exemplo, que representa Jesus no momento em que Pilatos O apresentou à multidão. Por isso lhe chamam o “Ecce Homo”.
A primeira procissão do senhor Santo Cristo dos Milagres aconteceu quase de certeza numa 6ª-feira, dia onze de Abril de 1698. A data com mais frequência repetida, onze de Abril de 1700, é absolutamente improvável, porque esse dia foi Domingo de Páscoa. Além de se haver tratado de uma procissão de penitência, o que anula a hipótese de ter sido realizada em data tão festiva, atente-se no que a certa altura diz o padre José Clemente ao descrever o cortejo: “Em último lugar ia o pálio com o Santo Lenho, a que acompanhava uma tão numerosa multidão de povo, que os oficiais deixaram o trabalho, os mercadores as lojas e os forasteiros as vilas e lugares circunvizinhos.” Era impensável que houvesse alguém que se atrevesse a trabalhar em dia santificado. A obrigação do descanso dominical era absoluta, havendo até a imposição de ao menos uma pessoa em cada família assistir à missa do dia, sob pena de pagamento de 50 réis, como deixou expresso o Bispo D. Frei João dos Prazeres na sua visita à paróquia de Pedro Miguel, no Faial, em 1690.


Lamentação

“Os nossos pecados atraíram
o desprezo do Senhor sobre nós,
como um pastor que esquece os nomes das suas ovelhas
e não reconhece os balidos dos seus cordeiros.
A desolação esteve durante o dia nas nossas casas
e deitou-se, à noite, nas nossas camas.
O calor do fogo era como gelo para os nossos corpos,
e o mel mais amargo do que o fel nas nossas bocas.
Não desejávamos o dia, durante a noite,
porque todos os dias eram dias de sofrimento.
Temíamos o entardecer
porque cada noite era a noite do nosso pavor.”

Isto disseste do teu Deus
como se Ele tivesse empunhado a espada contra ti,
como se Ele te houvesse alvejado com as setas do ódio.
Mas, quando vires o Filho do Homem
erguido sobre a terra da desolação,
contarás um a um os seus gemidos
e uma a uma as gotas do seu sangue.
Saberás então que o Senhor habita contigo para sempre,
que aquele é o preço por que serás libertado.
Eu tomarei sobre Mim as tuas culpas
para que, por todo o sempre,
Deus não reclame nenhum dízimo de sangue.
O Senhor veio a ti de mãos vazias,
e lavará os pés, antes de serem trespassados,
para que nem sequer o pó dos teus caminhos
receba a afronta dos cravos do sacrifício.

(fotografias gentilmente cedidas pela editora Ver Açor)

26 comentários:

carmélio disse...

Daniel,

De que ilha são as imagens?

Ibel disse...

Daniel, como tu és enorme!!!
Deixas-me sem palavras, mas vou reter estas:"Os olhos humanos precisam de reflexos divinos para se aproximarem do Infinito. Que podem ser as cores do ocaso ou as pétalas de uma flor.".
Ai que lindo tudo!!!Ai que lindo. E logo hoje...
OBRIGADA!!!!

Mar-ia disse...

Coisas demasiado sérias para comentários triviais.
Mas deixo uma questão no ar.
Será esta mesmo a maior festa açoriana, ou no Espírito Santo encontraremos uma maior "horizontalidade" fruto de uma participação e crença generalizada das nossas gentes?

samuel disse...

A minha natural inclinação para respeitar os actos de fé dos crentes, que a educação enquanto filho de "pastor" incentiva e o afastamento total da igreja, não destruiu, tem sempre que resistir ao veneno que é o espectáculo dos aproveitadores, vendilhões e charlatões vários, que pairam sobre a fé dos seres humanos, como uma núvem tóxica.
Depois, frases como "Os olhos humanos precisam de reflexos divinos para se aproximarem do Infinito. Que podem ser as cores do ocaso ou as pétalas de uma flor", salvam o dia.
Os reflexos "divinos" podem ser tantas coisas...

Abraço

Daniel disse...

Carmélio
Pareces a ASAE. Se não vê nada de mal, de nada se queixa. Mas basta uma mosca no ar, para armar um sarilho. Pois vamos lá matar essa mosca, que todos entenderam que voava em S. Miguel, na cidade de Ponta Delgada. Está bem morta, já?
Ibel
Belo dia, sim, para a tua menina fazer anos.
Mar-ia
Minha querida, eu não disse em parte alguma que era a maior festa açoriana, disse? A maior festa açoriana claro que é a do Espírito Santo. Mas a maior festa dos Açores, a que num mesmo lugar concentra mais gente, é esta. Nem podia ser noutra ilha, dada a população de cada uma. Mas até nisso, relativamente à percentagem de participantes, o Santo Cristo da Graciosa seria maior, reconheço.
Samuel
Deus pode ver-Se em qualquer coração de boa vontade,por exemplo. E olha que estas coisas vistas de perto talvez não envolvam tanta hipocrisia como pode parecer. Por exemplo, todos os anos, quer por intermédio do Bispo (que ainda hoje o fez) quer do reitor do Santuário e de muitos párocos, os cumpridores de promessas são aconselhados a não fazerem tais penitências.

Cris disse...

Daniel meu querido
"Os olhos humanos precisam de reflexos divinos para se aproximarem do Infinito. Que podem ser as cores do ocaso ou as pétalas de uma flor. Ou uma bela imagem feita por mãos desconhecidas".
Pronto.Uma vez mais fui ao infinito.
Esses reflexos costumam me silenciar...

Anónimo disse...

Daniel
Coisas trivais, referia-me a quaisquer meus comentários, obviamente.
Quantificar a pertença da festa não é da tua autoria, nem isso terá importância, atendendo ao que é realmente importante. Mas há muito quem o faça...e todos o fazemos um pouco, dada a importância que a "matemática" tem em nossas vidas.
Clarissima a tua opinião...
mar-ia

Daniel disse...

Cristina
No teu passeio de ontem ao continente, deves ter tido muitos encontros com o infinito, não fosse essa tua Santa Catarina uma terra de maravilhas.
Mercês
Eu deixei isso bem claro naquele livrinho em que tu também, e tão bem, colaboraste. Na pág. 14 pode ler-se:" O culto viria a expandir-se de tal maneira que se tornou no segundo mais popular dos Açores, terra por excelência do Espírito Santo."

Mar-ia disse...

Daniel
Vi-te hoje na RTPA a propósito do lançamento do livro, numa reportagem de minha sobrinha Laura. E vi a casa cheia, na Igreja do Colégio.
No meio de outra informação, escapou-me a referência que fazes ao "segundo" culto. Nada te falha, do que é util e verdadeiro.
E o timbre de seriedade.

Mar de Bem disse...

Nunca assisti in locco a esta Festa Maior. (E nunca assistirei, simplesmente porque não aguento ajuntamentos.)

No entanto sei que o POVO se transfigura e se perpetua nesta adoração ao SENHOR Sto. Cristo. (Não é o Senhor dos Passos, é o SENHOR Sto Cristo. Este SENHOR não é o Senhor!!! Vêde esta nuance.)

Este tema tratado em livro pelo Daniel e pela Mercês é um convite a uma meditação sublime. Bem hajam, meus preciosos AMIGOS.

Como poderei adquirir tal preciosidade?

Daniel disse...

Minha amiga de todas as Mercês, não sou infalível nem nada que se pareça. Mas gosto de fazer justiça à verdade.
Mar de Bem
Podes ter a certeza de que o trabalho da Mercês ficou excelente. Ela, a princípio um pouco receosa, aceitou o desafio e descobriu e revelou coisas que nem os próprios graciosenses sabiam!
Esperoo qu eo livro possa aparecer à venda no Faial. Aqui está na livraria Paulus, e em Lisboa também.

carmélio disse...

Caro Daniel,
Desconheço o que seja a ASAE.
Tem piada que estou em desacordo com o que nos tens oferecido, mas prefiro muitas vezes não comentar porque, primeiro, quando o faço, tu resolves charmar-me nomes como "anarquista" a coisas do género e não dar-me resposta.
Segundo, noto que já se formou (ou já estava formada) uma capelinha entre tu e as pessoas que aqui comentam e assim o sentido de intervenção bloquista não existe.
A minha pergunta desta vez foi simples mas decidiste não responder como de costume. Pois percebeste que ela trazia ironia, e é a razão daquela ironia que precisa ser dita: se tal manisfestação de fé é tão importante na ilha do arcanjo, porque não a citaste quando nos ofereceste o texto sobre aquela ilha?
Força!!!

Daniel disse...

Meu Caro Carmélio
Confesso que fiquei confundido. Se falas com ironia, por que razão parece que não a aceitas como resposta? Ou isto também foi uma ironia da tua parte, e eu é que agora respondo fora do tom?
Não referi Ponta Delgada (ou São Miguel) por duas razões. A primeira, porque penso que todos os leitores do Espólio sabem que escrevo de São Miguel, pelo que, mesmo os que eventualmente desconhecessem tal culto, não duvidariam de que a festa pertence a esta ilha. Segundo, porque a escrita tem um certo ritmo, e acrescentar "Ponta Delgada" ou "São Miguel" em alguma das frases quebraria um pouco o dito ritmo.
Espero que a referência a "capelinha" seja tão irónica quanto a minha à ASAE. E não julgo que haja um espírito bloguista, no sentido de que forçosamente tem de haver alguém sempre contra a corrente.
Terei pena se deixares de aparecer por cá e de comentar. E, se me permites, gostaria de saber com o que é que não estás de acordo, para a gente poder esgrimir as nossas razões.
Um abraço.
Daniel

carmélio disse...

Daniel,

Eu referia-me que não citaste tal manifestação de fé quando do teu trabalho sobre a ilha de São Miguel, e não neste último texto.
Mas afinal o que é a ASAE?
Claro que não há ironia a respeito da capelinha, e aparecerei sempre por cá porque gosto como escreves.

Daniel disse...

Ó Carmélio, para outra vez explica-te mais claramente, por favor. Se te referes ao texto sobre São Miguel, aquilo faz parte de um livro com muitas mais coisas, dividido por temas. O Santo Cristo foi tratado na parte correspondente às tradições culturais e religiosas.
E obrigado por cá vires e dizeres que gostas.

Mar de Bem disse...

Olá, Carmélio. Seja bem-vindo, porque aqui convém haver contraditório para dinamizar as nossas conversas, mesmo que venha em contra-mão.
Carmélio, queria um único artigo que englobasse as festas do Senhor Santo Cristo, com o de S. Miguel? Então porque não um único que englobasse todas as ilhas dos Açores? Seria chato, não seria? Então deixe que cada coisa esteja no seu lugar, porque há lugar para tudo.
Em relação ao grupinho que aqui está, já se formou há quase 2 anos através dum blog desaparecido o "Delfos". Nós ficamos tão amigos, tão fiéis, tão leais, que corremos sempre juntos, exactamente porque ficamos AMIGOS. PACIÊNCIA!!!

carmélio disse...

Mar de Bem,

Espero que esteja tudo bem contigo.
Quanto ao grupinho, é de louvar. Pois comigo, à medida que vou contando os anos, está acontecendo o contrário: menos amigos. Aliás, só ficaram os da adolescência, mas esses ficaram aí e eu tive que carregar a ilha para outras paragens.
Força!!!!!

Eduarda disse...

Gosto de ti,Carmélio.

carmélio disse...

Obrigado Eduarda!

Ibel disse...

Carmélio,
Muito bonito o seu comentário.Penso
que os amigos de infância são sempre um rebuçado que nos foi dado para saborear a vida inteira, tal como o primeiro amor.Mas a net tem-me trazido grandes amigos que não dispenso, gente de coração limpo, o tal grupinho que aqui vem buscar as palavras encantadas e míticas do Daniel, como as ilhas onde habitais.Felizmente tenho muitos amigos e sou caninamente fiel em relação às amizades.
Seja bem-vindo ao clube dos amigos do espólio.
Vai um abraço?

Mar-ia disse...

Entrou o Carmélio, saíu a ASAE???
Ele há cada sarilho...

Daniel disse...

Calma, meus amigos. Já vem aí São Jorge, sem o dragão. É uma das nove mais belas ilhas dos Açores, se bem que haja quem diga que é a mais bela de todas. Eu por mim não me pronuncio, porque sou parte interessada como filho de uma das nove candidatas.

Anónimo disse...

Daniel
Preciso da tua partilha.
Logo hoje que me sinto mais orfã.
Calou-se, Bénard da Costa.
Nunca o conheci, naquele sentido de ter estado alguma vez perto dele, mas dele sentia proximidade, atraída pelos seus dotes de escritor.
Outras actividades exerceu com notoriedade, mas era nas suas crónicas, nos seus discursos, que ele nos brindava com imagens do mais fino recorte. Inigualáveis
Alguns excertos:
“visitei pela primeira vez a Ilha de Bruma, a Terceira das achadas nos Açores…
Apaixonei-me por Angra do Heroísmo e por aquele mar tão negro como os cabelos da Branca de Neve”.

Venha a beleza com S. Jorge
Abraço
mar-ia

Daniel disse...

Mar-ia
O João Bénard da Costa era um daqueles espíritos que iluminam a vida. Senti também muito a sua morte,porque não sabia que ele estava doente. Era um homem que cuidava da felicidade dos outros, por isso talvez não quisesse que quem o amava, e éramos tantos, soubesse que ia perdê-lo.
Era uma papila que color-ria as searas.

Eduarda disse...

Também lamento sua morte.Era um espírito forte sim,e de uma candura extraordinárias!

Daniel disse...

Obviamente que eu queria escrever "papoila".
O meu "editor" afinal não cumpriu... Disse que ia pôr hoje o nosso São Jorge aqui, e não pôs. (Para mim, "hoje" termina sempre depois da meia-moite.)
Quanto ao JBC, Eduarda, definiste-o muito bem: "espírito forte de uma candura extraordinária".